quinta-feira, março 20, 2003

Em busca do mestre

Certos discípulos vivem me perguntando onde está a verdade — disse Maal-El. — Então, certo dia, resolvi apontar para uma direção qualquer, tentando mostrar que o importante é percorrer um caminho, e não ficar pensando sobre ele.

“Ao invés de olhar para a direção que eu apontava, o homem que me fez a pergunta começou a examinar meu dedo, tentando descobrir onde a verdade estava escondida.

Quando as pessoas procuram um mestre, deviam estar em busca de experiências que possam ajudá-las a evitar certos obstáculos. Mas, infelizmente, a realidade é outra: estão usando a lei do menor esforço, tentando encontrar respostas para tudo. Quem deseja beneficiar-se do esforço do mestre para poupar suas forças, nunca chegará a lugar nenhum, e acabará por decepcionar-se.

Quem estudar um pouco a história de Buda, notará que, após ter atingido a iluminação, dedicou-se a fazer com que seus discípulos desenvolvessem as qualidades necessárias para alcançar a tão esperada paz do espírito. Quem ler os evangelhos, irá reparar que a quase totalidade dos ensinamentos de Jesus acontece em duas circunstâncias: enquanto Ele viajava, ou em torno de uma mesa.

Nada de templos. Nada de lugares escolhidos. Nada de práticas sofisticadas e difíceis; os apóstolos prestavam atenção ao que Ele dizia enquanto andava, comia — algo que fazemos todos os dias de nossas vidas, e por isso mesmo não damos nenhum valor aos muitos ensinamentos que estão escondidos nas tarefas diárias.

Pensamos que as coisas sagradas são acessíveis apenas para os gigantes da fé e da vontade, e achamos que aquilo que a gente faz é pobre demais para ser aceito com alegria por Deus.

Em busca de nossos sonhos e ideais, muitas vezes colocamos nos lugares inacessíveis tudo que está ao alcance das mãos. Quando descobrimos o erro, ao invés de ficarmos alegres com a compreensão de nossas falhas, nos deixamos levar pela culpa de ter dado passos errados, investido nossa energia em procura inútil, ter causado desgosto a quem desejava felicidade. E então, perigosamente, nos aproximamos dos “mestres” ou “gurus” que irão recuperar o nosso tempo perdido.

Não é bem assim: embora o tesouro esteja enterrado na sua casa, você só irá descobri-lo quando se afastar. Se Pedro não tivesse experimentado a dor da negação, não teria sido escolhido como chefe da Igreja. Se o filho pródigo não tivesse abandonado tudo, jamais seria recebido com festa por seu pai. Se Buda não procurasse viver uma vida de sacrifício por muitos anos, jamais entenderia o prazer da alegria.

Existem certas coisas em nossas vidas que têm um selo dizendo: “Você só irá entender meu valor quando me perder — e me recuperar”. Não adianta querer encurtar este caminho.

Diz um velho ditado mágico: quando o discípulo está pronto, o mestre aparece.

Pensando nisto, muitas pessoas passam a vida inteira se preparando para tal encontro; quando cruzam com o mestre, entregam-se completamente — por dias, meses, ou anos. Mas terminam descobrindo que o mestre não é o ser perfeito que imaginaram, e sim uma pessoa igual a todas as outras, cuja única função é dividir aquilo que aprendeu.

Ao ver-se diante de uma pessoa normal, o discípulo sente-se lesado. Vem o desespero e o desejo de abandonar a busca — quando, na verdade, é assim que a coisa funciona, é isto que nos deixa livres para criarmos nosso próprio caminho.

Edenilton Lampião deu uma versão muito melhor para o tal ditado mágico: quando o discípulo está pronto, o mestre desaparece.

Paulo Coelho
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Su.: Só eu e Deus sabemos como esse texto me fez bem.

SuNamastê
Xa Ta Zac Xa Ta Amac

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