terça-feira, janeiro 15, 2013

A Ocupação Aldeia Maracanã é inclusive uma associação legal

 A Ocupação Aldeia Maracanã é inclusive uma associação legal


"No ano de 2006, um grupo de indígenas, de várias etnias, resolveu assumir o espaço que lhes eram de direito e ocuparam o prédio com o propósito de fazer dali um Centro de Referência da Cultura Indígena, além de abrigo para os “parentes” de diversas etnias que chegam a cidade. (...) Os indígenas reivindicam o lugar para que se converta na primeira Universidade Indígena, um centro de educação para o ensino da história, cultura e conhecimentos ancestrais.

Na ocupação, batizada de “Aldeia Maracanã”, cultivam verduras e frutas em uma pequena horta e cozinham em um forno a lenha.

(...) Um dos projetos que chama a atenção de quem visita a Aldeia é a proposta de mapear e se aprofundar na pesquisa das origens históricas de cada comunidade.

(...) Segundo Conhaque, 37 etnias construíram a Associação Indígena da Aldeia Maracanã no antigo museu. Os integrantes dessa entidade criaram esse status jurídico para que eles pudessem negociar com o governo a posse do local para os indígenas."
 

Fonte: http://www.virusplanetario.net/aldeia-maracana-memoria-luta-e-resistencia-indigena/


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Matéria na íntegra:

Aldeia Maracanã: Memória, Luta e Resistência Indígena

 

Por Aline Rochedo e Chico Motta
DSC07831Infelizmente, a dinâmica a que se refere à demarcação de diferenças ao longo dos processos  históricos  -apropriada pelo colonialismo, por regimes autoritários e pelo capitalismo na sociedade contemporânea- continua sendo exercida sob uma falsa ideia de democracia. Tal diferença reforça as múltiplas desigualdades na sociedade, deslegitima os movimentos sociais, e colabora para que nossa memória seja negligenciada.
Nos dias atuais, há ainda quem se comporte como os desbravadores do século XVI associando o domínio de uma cultura sobre outra a um processo legítimo e natural. Preconceituoso e cerceador, o termo civilizar ainda é utilizado repetidamente ao se referir aos índios, muitas vezes justificando ações truculentas e ilegítimas como a demolição do antigo prédio de Memória Indígena da Aldeia Maracanã.
No local, pretende-se construir um estacionamento e, mais uma vez, as autoridades governamentais priorizam interesses das grandes corporações, o transporte individual mais poluente e elitizado, e atropela-se parte importante da nossa História e nosso senso de coletividade.
Ressaltam que se trata de revitalizar o “Maracanã”, palavra ironicamente de origem tupi, como se demolir um edifício histórico mais antigo que o próprio estádio fosse essencial ao projeto. Falácia deslavada, desmentida pela FIFA e por diversos pareceres técnicos.
A Narrativa dos fatos
O casarão de 150 anos pertenceu a Duque de Saxe, que o do
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ou para que o governo federal a transformasse em Centro de Pesquisa sobre a cultura indígena. O lugar já foi sede da Escola Nacional de Agricultura e também sediou o antigo Serviço de Proteção ao Índio (SPI).
O prédio não ficou muito tempo sendo utilizado para preservar e difundir a cultura indígena. Em 1977 o museu foi transferido para o bairro de Botafogo e o prédio da Aldeia Maracanã passou para as mãos da Companhia Nacional de Abastecimento, que durante anos abandonou o casarão e o deixou praticamente em ruínas.
O lugar, considerado histórico e sagrado pelos povos indígenas, passou a ser ocupado por moradores de rua e usuários de drogas e seguiu durante anos abandonado pelo poder público. No ano de 2006, um grupo de indígenas, de várias etnias, resolveu assumir o espaço que lhes eram de direito e ocuparam o prédio com o propósito de fazer dali um Centro de Referência da Cultura Indígena, além de abrigo para os “parentes” de diversas etnias que chegam a cidade. As autoridades do Rio de Janeiro pretendem transformar o espaço simbólico e estratégico em um centro comercial ou um anexo da secretaria de Esportes. Os indígenas reivindicam o lugar para que se converta na primeira Universidade Indígena, um centro de educação para o ensino da história, cultura e conhecimentos ancestrais.
Na ocupação, batizada de “Aldeia Maracanã”, cultivam verduras e frutas em uma pequena horta e cozinham em um forno a lenha. O lugar, além de centro cultural, serve de abrigo temporário ou permanente para índios de todo o país que chegam ao Rio de Janeiro para trabalhar, estudar e participar de eventos.

Por uma Memória viva
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Abandonado pelas autoridades em 1978, foi ocupado desde 2006 por representantes de diversas comunidades
indígenas, como Puris, Botocudos, Tapajós, Guajajara, pataxós, tukanos, fulni-o e apurinãs, Potiguaras, Guarani, Kaingáng, Krikati, Pankararu, Xavante, Ashaninkas, entre outras.
Desde que assumiram o espaço, os índios demandam do poder público a revitalização do prédio para que possa se tornar o primeiro patrimônio nacional gerido e administrado por indígenas. Eles passaram a receber escolas, universidades, pesquisadores e simpatizantes e desenvolver atividades culturais, educacionais e de línguas das diversas etnias originárias de todo o território nacional.
Um dos projetos que chama a atenção de quem visita a Aldeia é a proposta de mapear e se aprofundar na pesquisa das origens históricas de cada comunidade. Os grupos se reúnem para estudar, traçar perfis regionais, peculiaridades de costumes, troncos hereditários, etc. Faz parte da preocupação dos Índios, além disso, pensar estratégias de manutenção e preservação dos idiomas ameaçados de extinção (sendo alguns já extintos), em especial, os que se dividem nos troncos linguísticos macro-jê e tupi-guarani.
Dauá Puri, um dos indígenas idealizadores do projeto, relata que o grupo de estudos já conta com mais de 40 pessoas que se empenham em contextualizar a tradição com a atualidade “trata-se de uma luta de defesa pelo patrimônio nacional que perdura mais de 400 anos. Queremos conquista este direito da plena cidadania indígena no Rio de Janeiro”. Nesse processo os interessados são acolhidas muito afetuosamente, “se você quiser saber sobre as suas origens indígenas é orientado com informações sobre as sociedades indígenas possíveis a partir dos dados apresentados pela pessoa”,  explica Dauá.
Além da pesquisa e mapeamento histórico, a intenção em fazer conhecidos seus costumes tem a culminância na “contação de histórias” nas tardes de sábado que se tornou um atrativo a mais para os frequentadores do local.
A ideia de um espaço que priorize tais iniciativas é determinante para que os indígenas encaminhem outros projetos como a utilização do prédio para sediar uma universidade que intensifique esses estudos. E para isso contam com o apoio da sociedade e do governo.

A proposta não pode ser interrompida
Segundo Artur Romeu, que acompanha o trabalho da aldeia, desde que assumiram o espaço, os índios demandam do poder público a revitalização do prédio, para que possa se tornar o primeiro patrimônio nacional gerido e administrado por indígenas: “Eles passaram a receber escolas, universidades, pesquisadores e simpatizantes e a desenvolver atividades culturais, educacionais e de línguas das diversas etnias originárias de todo o território nacional”.
Para Mariana Reis, educadora e simpatizante do movimento, a legitimidade já é ganha a partir do momento que o espaço é um espaço histórico: “uma intervenção deve ser feita no sentido de fazer ser conhecido como espaço de patrimônio histórico”, enfatiza.

Ameaça gera Resistência
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No último sábado, dia 12, por volta das 6h da manhã, os indígenas que se encontram na Aldeia Maracanã, foram surpreendidos com a chegada da tropa de choque da polícia militar no local com a ameaça de remoção dos mesmos. Marcelo Freixo, deputado estadual e presidente da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania, que acompanhava a situação, conversou com o comandante do Batalhão de Choque perante uma iminente invasão da Aldeia, assim como com os indígenas e simpatizantes da causa, propondo calma de ambas as partes. Para Freixo, o patrimônio histórico imaterial indígena deve ser valorizado e desabafa: “me diz um país que se preparando para a Copa do Mundo venha a destruir um museu?”.
Para Julio Conhaque, membro da Secretaria Executiva Nacional da CSP-Conlutas , o clima na Aldeia Maracanã é de resistência contra a desocupação. Condaque explicou que o empresário Eike Batista, o Comitê da Copa e o governo, estão com uma ação, que tramita há três anos, de liberação do espaço para no lugar construir um estacionamento: “o Estado decidiu alienar o espaço para outros fins, contrariando um processo dos indígenas para o tombamento do local”.
Segundo Conhaque, 37 etnias construíram a Associação Indígena da Aldeia Maracanã no antigo museu. Os integrantes dessa entidade criaram esse status jurídico para que eles pudessem negociar com o governo a posse do local para os indígenas. “A Ocupação serve como símbolo de resistência dos índios e de luta de preservação de sua cultura e a costumes”, salientou.
Sua presença é Força
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A provável demolição do museu indígena não condiz com a lógica da diversidade cultural que tanto se preza nos dias de hoje. Precisamos voltar e reaprender o que foi esquecido. Reivindicar uma sociedade na qual as potencialidades e possibilidades de se viver a vida são respeitadas, compreendidas e legitimadas. Não é questão para sermos imparciais.
Dauá acredita que ao mobilizar todas as pessoas entre apoiadores, estudiosos, a se posicionarem em prol desta luta, já significa de certa forma, o realizar desta utopia: “a presença de amigos fortalece nossa causa e  nos impulsiona a continuar acreditando”. Então, reflita e aceite este convite. Sua participação é necessária e fará diferença.

 



 

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